Se algum dia juntarem escritores, dramaturgos, realizadores e artistas numa conferência e lhes pedirem que nomeiem a temática que mais linhas fez escrever, peças fez ensaiar, películas fez filmar ou canções fez cantar, estou seguro de que a resposta será consensual: a Paixão.
Paixão é deveras o Santo Graal de todos os sentimentos. Sabemos que existe, às vezes andamos uma vida inteira no seu encalce, muitas vezes morremos sem a desenterrar, mas para muitos de nós é aquele combustível que nos faz viver. Não estou a reduzir essa imensa chama a apenas um amante, não. O romantismo não se queda na sua aceção mais literal. Refiro-me sim a todas as coisas que fazem o nosso coração bater mais depressa, às que nos fazem esquecer tempo e espaço e perder no estado de desorientação mais orientado que existe neste mundo!
Esta busca pela Paixão por vezes é tão cega que quase a deixamos passar incógnita pela nossa porta. Recordo-me deste ano estar num grande festival de verão na nossa capital. No já cinzento da memória, a negritude do céu faz-me supor que talvez já fosse o concerto de Tom Walker ou de Bon Iver, quando próximo do final da atuação é projetada nos ecrãs gigantes das laterais do palco uma imagem que me ficará para sempre. Era o retrato de um rapaz bastante entusiasmado com o concerto, de olhos focados em frente em direção ao artista principal, ladeado para uma jovem que o mirava de baixo. E os olhos daquele belo rosto feminino brilhavam. Ai se brilhavam! E brilhavam mais intensamente que qualquer luz ondulante de telemóvel que nesse momento se encontrasse acesa no ar. Durante meros três segundos, os mais atentos puderam ver como cintilam os olhos apenas por estar preenchidos pela sua Paixão,
num ambiente em que a sonoridade dos versos espalhava um clima de romantismo.
Claro, isto foi apenas um momento, um instante, um screenshot de todo um filme que só os protagonistas saberão (um dia?) como irá terminar. Porque não nos deixemos enganar: Paixão, Amor... toda essa montanha-russa de emoções está fora do nosso controlo! Materializar as Paixões de uma vida é o décimo terceiro trabalho de Hércules. Os anos inexoravelmente passam e chegará o dia em que adormeceremos embalados por uma sensação aconchegante no coração... um sentimento belo, mas que nessa altura saberemos que nunca se irá concretizar! Quando esse dia chegar, será sinal de que já teremos vivido muito e sofrido outro tanto. Quando esse dia chegar, já teremos aprendido o verdadeiro e único segredo para viver em Paixão eterna: não é lutar incessantemente para ela nunca se apagar, é sim aquecer o coração na lareira enquanto essa chama durar!