domingo, 10 de novembro de 2024

Sol de Outubro

Ai, Sol de Outubro!

Sol por vezes ainda mais quente do que o seu sósia num dia de verão.

Ai, Sol de Outubro! Trazes-me boas memórias.
Invariavelmente os teus raios amarram-me como tentáculos e puxam-me para junto de ti, onde o teu brilho intenso ofusca a visão do presente e me transporta para Aquele Outro Tempo.

Na minha testa já febril como a de uma criança que, contra a advertência da avó, teima em brincar ao sol sem boné na cabeça vêm as memórias d'Aquele Outro Tempo.

Recuo aos primórdios do tempo de faculdade. No meu ano de caloiro, as aulas só começaram a 26 de setembro. A primeira grande vaga de Praxe Académica prolongou-se diariamente pelo mês de outubro até rebentar no êxtase no Cortejo da Festa das Latas e Imposição das Insígnias no dia 1 de novembro. Uma terça-feira, e por coincidência um feriado, que permitiu a mais famílias vir assistir  ao desfilar dos caloiros em trajes alegóricos como se de um carnaval se tratasse.

Ai, Sol de Outubro!


Que saudades me trazes tu d'Aquele Outro Tempo em que eu tinha mais cabelo e menos preocupações.

Porventura, estarei a ser injusto. Preocupações sempre as houve, sempre as há. Mas eram diferentes. (Elas são sempre diferentes...) Mas eram as preocupações normais e expectáveis para Aquele Outro Tempo. As de agora nem todas o são.

N'Aquele Outro Tempo o que me apoquentava era sobreviver a mais um dia de Praxe. Era sobreviver à matéria que se acumulava todos os dias sem fim. Era sobreviver ao teste de Anatomia ao virar da esquina.

Hoje o que me atormenta é o Futuro.

Já morei nalguns lugares. E penso sempre que um dia gostaria era de regressar à minha terra. Acontece é que só agora verdadeiramente estou a compreender que essa terra não é aquela terra palpável que julgava ser. Essa terra foi crescendo no interior da minha testa febril como a de uma criança que brinca ao sol sem boné. Desconfio cada vez mais que essa terra é na verdade Aquele Outro Tempo.

Um tempo que vive no rosto familiar de uma pessoa conhecida, com quem nos cruzamos na rua.
Essa terra é certamente Aquele Outro tempo.
Um tempo em que o Sol de Outubro também brilhava intensamente.
Mas era um tempo em que as preocupações eram outras, as preocupações d'Aquele Outro Tempo.

Saudoso,
Aquele Outro Tempo.