sábado, 29 de setembro de 2018

Bons valores não escolhem carteiras!

Há uns tempos reencontrei um bom amigo que fiz nos meses de Erasmus em Maribor. O alemão de metro e noventa e tal tinha vindo passar uma semana de férias a Lisboa. A estagiar num importante banco de Frankfurt, este meu amigo alemão, todos os dias vestia um fato e gravata cujo preço muito provavelmente até dava para pagar dois ou três conjuntos semelhantes para o baile de finalistas do 12.º ano ou mesmo para uma cerimónia mais pomposa, como o Juramento de Hipócrates. Hospedado num dos mais caros hotéis de Lisboa, a dois passos da Avenida mais dispendiosa de Lisboa, de Portugal e quiçá da Europa, este turista recebe-me de braços abertos, como se nos conhecêssemos desde sempre. E nós que apenas havíamos privado 3 semanas das nossas vidas até àquele momento. A amizade essa, foi instantânea, tal como as mensagens trocadas semanalmente pelas redes sociais, numa conversa de grupo que junta pessoas da Alemanha e Portugal, mas também República Checa e Hungria. As amizades que ficam para a vida, sem dúvida alguma, constituem a mais suculenta fatia desse bolo de chocolate que é a experiência Erasmus.
  
Para celebrar a sua vinda ao nosso grande Portugal, quis presentear o “velho” amigo com algo alusivo ao país campeão europeu de futebol. Não admira, por isso, que me tenha ocorrido oferecer o tradicional cachecol do Sporting ou da Académica, algo que decerto cairia no goto de um apaixonado pelo futebol como ele é, mas depois tive outra ideia e decidi regalá-lo com algo respeitante à minha Terra Natal. Assim, levei um pólo com as 8 letras que compõe o nome da minha bela Penacova inscritas ao peito para o meu amigo de Dusseldorf. E ele não só gostou como de imediato despiu o seu pólo da Tommy Hilffiger® e experimentou aquele XL que o português lhe acabara de oferecer! E mais: para minha surpresa anunciou que o iria usar naquela mesmíssima noite! Ele que tinha despido um pólo caro para vestir um todo vincado e baratucho, que no lugar do símbolo da marca americana tinha estampado Penacova. Um gesto que me tocou bastante! A espontaneidade com que anunciou aquela humilde forma de gratidão para comigo, o modo como um estrangeiro vem ao nosso país e respeita assim um pedaço de terra que nem sequer conhece, mas que sabe que é a terra de um amigo seu, é de louvar e partilhar com o mundo.

É que de facto, há carteiras que apesar de custarem a dobrar e a caber no bolso de um bom par de calças de seda, ainda assim têm espaço mais que sobra para acomodar um tão bondoso coração!


domingo, 23 de setembro de 2018

Crónica à minha tia

Com a obra Memorial do Convento, José Saramago expandiu o significado da velha máxima popular “Por trás de um grande homem, há sempre grande mulher.”. As marcantes estórias relatadas em torno da História do Convento de Mafra tornaram anedoticamente redutor atribuir a construção do emblemático monumento apenas ao rei D. João V e ensinaram-nos que, por trás de um grande rei, tem de estar definitivamente um ainda maior povo!

Sucede que eu tenho um primo jornalista de que me orgulho bastante! Como foi destemido e encarou o jornalismo como a sua grande paixão, foi subindo com a força do trabalho as íngremes escadas do ofício até alcançar a notoriedade que lhe é reconhecida atualmente.

Naturalmente, grandes feitos como estes não se alcançam por acaso.... Por exemplo, no FC Porto existem profissionais que resolvem muitas das questões pessoais dos jogadores, fazendo com que os craques apenas tenham de se preocupar em treinar e jogar, tal como se constata nos diversos livros versados aos sucessos dos Dragões ao longo dos anos. É precisamente esta rede de suporte que costuma ficar esquecida na penumbra da História e que Saramago tão bem iluminou com o seu romance. No caso do meu primo jornalista, este precioso apoio é assegurado fundamentalmente pelos pais, meus tios.

Ora, a minha tia, professora aposentada, é danada! Uma autêntica mulher do Norte! É perfeccionista e, como tal, muito meticulosa com todos os aspetos da sua vida. Enquanto docente, procurou sempre dar o melhor exemplo aos seus alunos, muito para além das matérias que lhe estavam incumbidas de lecionar. Estas e outras preocupações condicionaram um estilo de vida que a levou a sofrer um AVC, colocando-a às portas da morte. Felizmente, e quase inexplicavelmente, recuperou e assim adiou o merecido encontro com o Criador. Reformou-se e passou a dedicar a sua vida ao outro filho, que padecia de uma doença grave desde nascença. Até à sua partida, foram décadas de uma luta que muito a desgastaram. Ainda hoje, nos raros momentos em que lhe é permitido sentar-se no sofá e desligar um pouco das mil-e-uma coisas que tem para fazer, a perda deste filho naturalmente ainda lhe faz nascer lágrimas no canto dos olhos. Só que a real fonte das suas inquietações não é essa. Ironicamente, até são estas que mais a afastam das marés de tristeza. Neste momento, a sua grande preocupação (e alegria) são os netinhos que o meu primo jornalista lhe deu.

E por vezes parece que o verbo “dar” é mesmo o mais adequado, pois, à semelhança de muitos outros avós, não raras são as ocasiões em que ela se transforma no “depósito” dos netos! Senão vejamos: é ela quem os leva aos treinos de futebol; é ela quem os leva à natação; é ela quem os leva ao Inglês; é ela quem fica com eles nas noites em que os pais querem ter tempo para si próprios como todos os casais necessitam... E ela faz tudo isto no meio da babel que constitui a enorme cidade de Lisboa! 

Por isso, às vezes interrogo-me: como é que o meu primo jornalista vai conseguir continuar a ensinar o mundo aos meus priminhos quando os pais lhe faltarem?

Infelizmente, a frágil saúde da sua mãe, minha avó, também não ajuda nada! Mas ainda que morando a mais de 200Km, a distância nunca foi um impedimento para, por exemplo, levar a minha avó às consultas de que necessita.

Como já devem ter percebido, existe um forte motivo para estar a pessoalizar este texto no grande ser humano que é a minha tia. Não é que o talentoso e multifacetado do meu tio não desempenhe um marcante papel na educação dos meus priminhos. Não, antes pelo contrário! A razão de dedicar esta crónica à minha tia é que, por estes dias, ela está a atravessar um período conturbado que coincide com a bênção de completar mais um aniversário.

Tia, para além dos óbvios Parabéns quero principalmente dirigir-te um sentido Muito Obrigado por tudo o que fazes por nós! Estou certo, tia, de que, quando começares a vislumbrar os ainda ténues raios de luz que rasgam as nuvens negras que se condensaram na tua existência, irás estar a olhar-te ao espelho e a perceber o sol resplandecente que és nas nossas vidas!

domingo, 16 de setembro de 2018

Sporting e PSD: a "riqueza" que os (des)une!

Sporting e PSD. “O clube e o partido dos ricos”. É assim que estas instituições têm vindo a ser rotuladas ao longo dos seus largos anos de existência. Mas será que efetivamente essas etiquetas lhes colam assim tão bem?

Na vida nem tudo é preto ou branco, mas existe indesmentivelmente algo a unir sportinguistas e social-democratas. E não, não são as tais chorudas contas bancárias dos seus simpatizantes. E também não é a cor laranja, tonalidade imediatamente associada ao partido político de centro-direita e que o clube de Alvalade exibiu no equipamento alternativo da horrível temporada de 2012-2013. O que tem vindo a unir estas instituições é sim a marcada instabilidade interna! 

Começando pelo Sporting, com as eleições do passado dia 8 de Setembro, os Leões elegeram o seu 43.º presidente, Frederico Varandas. Este acontecimento foi o culminar dos meses mais vergonhosos da história do clube, cujo episódio mais triste foi seguramente o das agressões à equipa de futebol sénior no dia 15 maio em Alcochete às mãos de 50 elementos alegadamente afectos ao próprio clube!

Por seu turno, o PSD elegeu o 18.º presidente desde o 25 de abril de 1974 no início do ano, Rui Rio, que sucedeu a um Pedro Passos Coelho que nunca recuperou verdadeiramente da mágoa do afastamento do governo pela “Geringonça de Esquerda”.

Depois de um jejum de 18 anos sem campeonatos nacionais de futebol sénior conquistados, os Leões tiveram na dobragem do século também um virar de esperança com 2 títulos em 3 anos, mas foi sol de pouca dura. E a partir da demissão de José Eduardo Bettencourt, em 2011, o Sporting entra numa roda viva de eleições e demissões presidenciais. Primeiro Godinho Lopes, depois Bruno de Carvalho. E pelo meio, uma resma infindável de treinadores e jogadores contratados, tendo o Sporting inclusivé a espaços jogado às urtigas a aposta na Academia.

Já os Laranjas passam por um período algo similar ao leonino, nos anos que sucederam à partida de Durão Barroso para a Comissão Europeia e à demissão de Pedro Santana Lopes após a derrota para José Sócrates nas Eleições Legislativas de 2005. Seguem-se 3 líderes até que o PSD encarreira durante uns tempos com Pedro Passos Coelho. Primeiro é Marques Mendes, depois é Luís Filipe Menezes e por fim, Manuela Ferreira Leite.

Ora, ainda mais interessante é verificar que os sinuosos galhos e ramos desta árvore entroncam bem mais atrás na linha temporal, no elemento central desta história toda: o fim de uma grande liderança! João Rocha no SCP. Cavaco Silva no PSD. Cada um destes senhores marcou uma era de grande prosperidade na respetiva instituição. Em 13 anos de Sporting, o setubalense conquistou 3 campeonatos nacionais de futebol e nas modalidades, então, deixou um legado impressionante com vários títulos europeus no palmarés. Já o economista de Boliqueime governou o País durante uma década (1985 a 1995), alcançando duas maiorias absolutas nas três eleições que disputou.

De facto, a entropia gerada pela partida do grande líder é por vezes demasiada... E a sabedoria popular pode ajudar a perceber melhor as razões para a poeira tardar em assentar...

Em casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão. Este parece ser o problema do Sporting. Se o Sporting tem ganho aquele campeonato em 2006-2007 com Paulo Bento ou o de 2015-2016 com Jorge Jesus, quem sabe onde o clube estaria agora? Será que as nuvens de instabilidade ainda tapariam o sol em Alvalade?

Dois galos para um só poleiro. Bem, na verdade não são apenas dois, são vários, talvez um galinheiro inteiro repleto de cristas, umas ansiosas por dar o salto, outras frustradas por já o terem falhado. Este parece ser o problema do PSD. Basta ver os programas de comentário político para o perceber. O permanente negativismo em torno dos sucessivos líderes do próprio partido tem vindo a marcar uma profunda diferença para com a concorrência e é aí que os sociais-democratas começam a perder eleições.

Pelos vistos, parece que a tal riqueza monetária não é o maior factor de ligação entre SCP e PSD. É, sim, ironicamente a fraqueza dos elos internos que mais os aproxima, condicionando um notório clima de guerrilha endógena semanalmente noticiado nos órgãos de comunicação social.

Rui Rio já foi eleito há 8 meses. Frederico Varandas foi eleito apenas há 8 dias. Se no caso do político já percebemos que a instabilidade continua, no que concerne ao médico que vai tentar curar o “mal de Alvalade” só os próximos tempos dirão o que lhe espera.


PS: Um agradecimento muito especial aos meus colegas Filipa e Castilho pela profícua troca de ideias que culminou na redação deste texto.