Quarentena. Isolamento Social. Estes são dois termos que todo o mundo se habituou a pronunciar neste virar de década.
Fruto de um poder de propagação de que não há memória, a COVID-19 tem votado milhões de famílias e amigos ao afastamento. Pois bem, num mundo que dispõe dum manancial de terapêuticas meticulosamente desenvolvidas em laboratório para as mais variadas maleitas, ironia das ironias, parece que a distância é a única arma para travar o avançar implacável deste vírus.
Dilema. Este é outro dos vocábulos que mais têm cruzado a mente de toda a gente. Não que seja noticiado como a exaustiva e compulsiva atualização diária dos números da pandemia, mas a verdade é que muitos de nós também estão a tentar sobreviver à autêntica turbulência de pensamentos e sensações que tem posto o nosso intelecto à deriva nestes últimos tempos.
Por esta altura, completam-se sete semanas desde a última vez que estive na “minha terra”, Penacova. Nesse fim de semana de 14 e 15 Março, já muito se especulava sobre o que iríamos viver nas semanas que se seguiriam. E o cenário do Estado de Emergência acabou por se confirmar escassos dias mais tarde, começando a vigorar a 18 de Março. Independente disso, as idas a “casa” seriam invariavelmente suspensas por tempo indeterminado. É que como médico tenho de dar o exemplo! Primum non nocere. Primeiro não prejudicar! O princípio bioético da não-maleficência pela qual todos os médicos e restantes profissionais de saúde se devem reger, diz-nos que devemos evitar a todo o custo fazer mal aos nossos doentes. Como tal, se numa situação normal não estaria afastado mais do que dois fins de semana da “minha terra”, não posso de maneira alguma ignorar o facto dos meus pais estarem numa faixa etária de risco para as tormentas a que têm sido votados por este novo Coronavírus muitos dos adultos de meia idade por esse mundo fora.
Por isso, por mais saboroso que fosse galgar pelo asfalto e romper por entre a floresta só para os abraçar, a verdade é que tal poderia representar um amargo dissabor. E se eu estiver contaminado e não tiver sintomas? E se eles contraírem doença? E se, por azar, até ficam gravemente doentes? Primum non nocere. Primeiro não prejudicar! É nisto que cada um de nós tem de pensar para conseguir proteger ao máximo os seus. Para todos conseguirmos proteger todos!

Primum non nocere. Primeiro não prejudicar! Desde sempre que nós contribuímos para espalhar infeções. Tantos doentes que fomos ver sem as devidas cautelas! Tanta roupa conspurcada que levamos para casa!
Agora que entramos num período em que se vai assistir ao aliviar do cinto desta austeridade social, mais do que nunca se exige cuidado para não prejudicar aqueles de quem mais gostamos e aqueles de quem nem o nome sabemos! O Estado de Emergência apenas acabou no papel! Ainda mal superamos a primeira onda da pandemia... ainda mal emergimos a cabeça destas águas agitadas... ainda mal expelimos esta água em que quase afogamos os nossos pulmões... já estamos convencidos que podemos virar já as costas ao oceano. Não podemos fazer isso! Se agora cairmos na relaxante armadilha de deixar o corpo boiar ao sabor destas águas perigosa e enganadoramente mais tranquilas, é quase certo que vamos acabar por ser apanhados desprevenidos! É que agora que vamos começar (lentamente?) a nos reaproximar, uma nova vaga da pandemia se perspetiva no horizonte e talvez assim não tão distante quanto hoje se julga. Primum non nocere. Primeiro não prejudicar! Só nós podemos travar este novo tsunami pandémico!